Quarto capítulo da série: Biografia de Walt Disney


Primeiro Capitulo: A Fuga part. 4

Apesar das declarações dos filhos sobre a frugalidade do pai, Elias Disney não guardava todo o dinheiro. Continuou a investir e especular na esperança de ainda poder ficar rico, mesmo em sua idade avançada. Elias começou a investir pouco depois de chegar a Kansas City – e a investir pesado. Flora comprou cem ações, em abril, da O-Zell . Elias comprou mais duas mil poucas semanas depois. Em maio de 1915, comprou mais 1.054 ações e outras 3.700 e setembro daquele ano. No ano seguinte, comprou 50 ações com as economias de Walt e mais 275 ações para si mesmo – tudo a US$1 por ação. Em dezembro de 1916, com os funcionários da O-Zell queixando-se de “dificuldades” nos negócios  Elias concordou em investir mais US$ 3 mil e se mudar para Chicago a fim de trabalhar na fábrica sob a condição de que Walt fosse colocado na folha de pagamento “um pouco mais tarde”.
Quando chegou a Chicago no fim do verão, Walt se registrou como calouro na William McKinley High School, no West Side de Chicago. Mas McKinley, como Benton, despertava-lhe pouco mais interesse. O desenho, sim, e Walt mergulhou nele com a mesmo alacridade com que o fizera em Kansas City. Walt demostrou um talento artístico incomum para os professores, e se tornou cartunista da The Voice, a revista da escola. Walt parece ter ficado a maior parte daquele ano desenhando caricaturas para The Voice, muitas delas com conteúdo político, comentando a guerra. Sua irmã afirmou que, durante os encontros sociais da escola realizados todas as quintas-feiras à tarde, ele se levantava e desenhava. Walt era tão excepcional em ilustração que, quando sua professora de arte passou o trabalho de casa para desenhar o corpo humano, Walt apresentou-lhe um desenho perfeito, ela pensou que ele o copiara e ordenou-lhe que fizesse outro na frente da classe. The Voice chamava Walt de “artista”.
No inverno, estimulado por um dos editores da The Voice, tinha aula três vezes por semana no centro da cidade, na Academia de Belas Artes de Chicago. Walt levou o pai a pagar pelas aulas, convencendo-o de que tinham valor educacional. Foi a primeira vez que Walt trabalhou com modelos vivos, e ficou tão envolvido no processo que não parava de desenhar nem para ir ao banheiro. Mas, apesar das aulas, Walt percebeu que jamais seria um grande artista e que seu talento estava na caricatura.

     Então, percebendo talvez o quanto eram pequenas as chances de conseguir trabalhar em um jornal, ele ainda não abandonara completamente a ideia do show business,  mas quando a escola fechou no verão, ele não buscou nem o desenho e nem o show business. Em vez disso, arranjou trabalho na fábrica O-Zell, construindo caixas, esmagando maçãs para obter pectrina e tomando conta de uma máquina de lavar  e tampar ops vidros de geleia. Às vezes, substituía alguém como vigia noturno, mas Sarah Scrogin, a jovem esposa do presidente da O-Zell, viu seus desenhos e estimulou. Ela também encarregou Walt de desenhar o cartaz para o piquenique anual e deu-lhe tempo durante o trabalho para fazê-lo.

Em julho, entretanto deixou o trabalho na O-Zell por outro no carreio como entregador de correspondência substituto. Em 3 de Setembro, Walt acabara de completar seu roteiro e estava caminhando pelo posto do correio no edifício Federal de Chicago, quando ouviu um barulho que descreveu como “VRUMMMMM!!!!” – uma explosão ensurdecedora que sacudiu o piso. No saguão, caía pó de todos os lados. A policia imediatamente fechou o edifício. Descobriu-se que alguém havia plantado uma bomba, ferindo 30 pessoas e matando quatro, inclusive um homem que trabalhava a duas mesas de distância de Walt. As autoridades discutiam se os criminosos eram radicais que esperavam libertar o cabeça da ala esquerda do sindicato trabalhista Industrial Workers of the World, William Haywood, que estava no 18° andar do edifício, ou anarquistas, ou ainda alemães.
Com a poupança do seu trabalho no correio, Walt deu entrada em uma câmera. Começou por filmar a si mesmo como Chaplin na rua atrás da casa de seus pais, com seu amigo Russell Maas. Walt teve a ideia de fazer filmes para crianças, mas, antes que pudesse realizar o projeto, a câmera foi tomada de volta pela loja.

Walt em sua adolescência.

Embora namorasse o entretenimento, contraía o vírus da guerra. Dois de seus irmãos já estavam prestando serviço militar: Ray tinha sido convocado para o exército e Roy, que se alistara voluntariamente, encontrava-se na estação naval. Embora fosse menor de idade, apenas 16 anos, Walt admitiu que se sentia envergonhado por permanecer em casa enquanto outros marchavam para a guerra.
Até mesmo antes de ir trabalhar nos correios, Walt tentara alistar-se na Marinha junto com Maas, mas ambos foram rejeitados por serem muito jovens. Foi Maas quem teve a ideia de juntar-se ao Corpo de Ambulância da Cruz Vermelha, pois a Cruz Vermelha nõ era tão rigorosa quanto as forças armadas, e a idade permitida para alistamento era 17 anos, não 18, como nos serviços regulares.  Como tinham apenas 16 anos, alistaram-se sob nomes falsos, mas a artimanha não deu certo. Eles ainda precisavam da assinatura dos pais para certificar a idade e, de qualquer maneira, a mãe de Maas achou um par de meias em sua mala de viagem, suspeitou de que algo estivesse acontecendo e alertou Flora. Depois que Walt confessou, Elias se recusou a assinar os papéis. “Se eu fizesse isso”, disse, “poderia estar assinado sua sentença de morte.” Flora não estava mais ansiosa que o marido para mandar o filho caçula para a guerra, mas Walt implorou, e ela, finalmente, cedeu, assinando por ela e por Elias e dizendo que, se não assinasse, provavelmente ele fugiria.
Ele só pensava na guerra como uma aventura. O trinamento pedia uma semana dirigindo ambulâncias e caminhões, outra semana em oficinas, aprendendo antes de zarpar para a França. Em poucos dias, porém, contraiu a influenza, uma epidemia que logo daria volta ao mundo e resultaria em 20 milhões de mortes. Como os hospitais eram considerados lugares não seguros, Walt foi levado de ambulância para casa para se recuperar. Quando isso aconteceu, três semanas depois sua companhia partiu para França. Walt voltou para o acampamento e foi mandado de trem para a França. Enquanto estava no acampamento King recebeu noticias que para ele foram terrivelmente decepcionantes: fora assinado um armistícia e a guerra acabara. “Todos os demais celebravam o fim da guerra, mas nós sabíamos que tínhamos ficado de fora de algo muito importante”, disse Walt. Ele convenceu-se de que agora seria mandado de volta para casa, mas a companhia foi acordada às três da manhã e informada de que 50 deles iriam para a França para ajudar na ocupação. Walt foi o último dos 50 nomes chamados. Walt, pequeno, com cara de jovem e parecendo mais jovem ainda, celebrou seu 17° aniversário logo depois da chegada. Na semana seguinte, a companhia foi despachada de caminhão para Paris para aclamar o presidente Woodrow Wilson em sua aparição na conferencia de paz.

Walt, com o caminhão da ambulância, em que dirigia na França.

Quando não estava dirigindo ou em pequenas viagens, fazia o que sempre fizera. Desenhava – cenas cômicas para o cardápio da cantina, apresentando um personagem que havia inventado. um soldado de infantaria, cartazes anunciando chocolate quente e chuveiro para soldados, desenhos nas janelas de lona das ambulâncias, caricaturas de seus colegas voluntários para que enviassem para as suas garotas e famílias, pelas quais Walt cobrava, caricaturas para os editoriais da McKinley Voice e para os amigos nos EUA com sentimentos ásperos, como, por exemplo, uma em que um soldado da Força Expedicionária Americana empurrava o Kaiser alemão de um penhasco e dizia: “Caia fora e fique longe”. Ele desenhava sentado em um tripé, que montou na base militar, sob a janela, e em seu caminhão.

Apesar de toda essa diversão na França, Walt sentia cada vez mais saudade de casa. “A França é um lugar interessante”, escreveu para The McKinley Voice, “mas, mesmo assim, quero ir para…”, e inseriu na carta uma caricatura de um homem gritando, “Oh! Eu quero voltar para a minha mamãe”.  Em julho, foi novamente designado para Paris, e mais tarde, diria que, ao observar Pershing ir embora com seus soldados no inicio de setembro, foi subitamente envolvido pela solidão e imediatamente pediu para ser desmobilizado. Mas isso fazia parte do sentimento dramático dos Disney.

Mas Walt Disney voltara outro homem da França. Começara a fumar na França, um hábito que era um anátema para o pai. Mais que isso, mudara emocionalmente, adquirindo na França, ele disse, “experiência de vida de uma só vez”. Walt havia amadurecido, tornara-se mais confiante e independente. “Eu estava resolvido”, foi como explicou mais tarde. “Eu… era capaz de traçar uma linha direta até o meu objetivo. E fui atrás dele.”

Havia abrigado duas ambições alternativas – ser ator ou ser artista. Então, o adolescente de 17 anos  Walt Disney, recém armado de confiança e determinação para evitar o destino do pai, a tristeza e o desapontamento constantes, faria o que os Disney sempre fizeram. Perseguia a sua oportunidade. Escaparia.

Fonte: Walt Disney – O triunfo da imaginação Americana de Neal Gabler, Editora Novo Século.

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